sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Quem foram os primeiros motoristas de automóveis na Laguna

Há alguns anos, como já informei em post anterior,  pesquisando documentos no Arquivo Público de nossa cidade, me deparei com um Livro de Registros da Prefeitura da Laguna.
Na capa da publicação os dizeres “Para Termos de Suficiência – Exame de Condutores da Laguna 1933”.
Willy Strack na direção do Ford T, 1915, pertencente a Júlio Berger. Primeiro automóvel da Laguna.
 
 A publicação estava empoeirada e meio comida pelas traças em suas beiradas, mas traz os registros oficiais dos primeiros motoristas da Laguna, de carroças e automóveis. E melhor: com fotos ¾ de todos eles. Uma preciosidade para qualquer pesquisador/historiador.
O Têrmo de Abertura com a assinatura do prefeito da Laguna Giocondo Tasso.

O Livro, e único exemplar que encontrei, abrange os anos de 1933, administração do prefeito Giocondo Tasso, a 1956, já dirigindo o Paço Municipal o prefeito Walmor de Oliveira.
Fotografei por inteiro o documento.
Para melhor entendimento dos nossos leitores, antigamente era a prefeitura quem organizava e realizava os exames de direção, contratando os examinadores e expedindo a Carteira de Habilitação.

Pelas anotações fica-se sabendo que o primeiro a se registrar em nossa cidade, em 25 de maio de 1933, foi Oscar Bergler, 28 anos, Carteira nº 1, sendo seu exame de habilitação prestado alguns anos antes, em 9 de maio de 1923 em Tubarão. Testemunhas do registro? Dr. Paulo Carneiro e Mário Bianchini.
Assinam ainda o documento o secretário da prefeitura José (Zeca) Freitas e o então prefeito-provisório Giocondo Tasso.
Oscar Bergler motorista com registro nº 1.
Oscar Bergler era filho de Júlio Bergler e Luíza Pires Bergler, residentes em nossa cidade.

Em 13 janeiro de 1915, conforme registro do Jornal O Albor de 17 de janeiro daquele ano, chegava a nossa cidade, no convés do vapor Anna, o primeiro automóvel da Laguna, de propriedade de Júlio Bergler, progenitor de Oscar Bergler.
"Está de hoje em diante, à disposição do público", conforme noticiou o periódico, registrando a grande atração.

Os pioneiros chauffeurs da Laguna
Como Júlio Bergler, proprietário, ainda não dirigia automóvel, quem tomou a boleia do veículo foi Willy Strack, que por sinal foi também motorista do primeiro caminhão, pertencente a Jacinto Tasso.
1º caminhão da Laguna. Um Ford 1913 pertencente a Jacinto Tasso. Na direção, Willy Strack.
 
   
O primeiro caminhão da Laguna foi adquirido em 1913 pela empresa Rovaris & Tasso e serviu para o comércio “entre esta praça e o município de Urussanga e as colônias de Azambuja, Pedras Grandes, Braço do Norte e, provavelmente, Araranguá”.
Veja abaixo, na íntegra, a notícia publicada no jornal O Albor de 31 de agosto de 1913:
Strack é considerado o primeiro motorista de automóvel/caminhão na Laguna, mas sua carteira foi registrada no município de Brusque.
Foi também um dos pioneiros em transportes coletivos em nossa cidade.

Quem foi Willy Strack
Willybaldo Ferdinando Strack era seu nome, mas ficou conhecido entre nós como Willy Strack. Personagem que está a merecer uma rica biografia.
Nascido na Áustria em 3 de setembro de 1890, filho de Felipe e Cristina Strack, veio recém-nascido para o Brasil junto com seus progenitores, passando a residir em Brusque.
Em 1914, aos 24 anos, buscando novas oportunidades, Willy veio para Laguna.
Aqui exerceu diversas atividades, entre elas a de músico nas projeções do cinema mudo no Cine Central no prédio do Teatro 7 de Setembro, pintor, mecânico, fotógrafo, motorista e instrutor de direção de automóveis.
Montou uma oficina de consertos e venda de autopeças e materiais elétricos situada no bairro Campo de Fora.
Foi representante comercial em nossa cidade dos aparelhos de rádio Zenith, valvulado, caixa de baquelite. E também dos aparelhos receptores Philips.
E aqui dou um testemunho pessoal. Muitas vezes, década de 70, a pedido do meu pai, fui até a sua casa comprar válvulas e outras peças para esses modelos de rádio, suprindo assim material de reposição que meu progenitor em sua oficina no Largo do Rosário necessitava para consertar aparelhos de seus clientes.

Publicidade da Oficina de Willy Strack.
Willy Strack foi tornado cidadão lagunense em 1975.
Faleceu aos 93 anos na madrugada de sábado, 19 de março de 1983. A rua no bairro Campo de Fora onde tinha sua residência, oficina e garagens foi denominada com seu nome  em sua homenagem. 
Dele disse em editorial o jornal O Renovador de 26 daquele mês:

“Willy Strack, como lagunista, foi mais lagunense, em toda acepção da palavra, que a maior parte dos aqui nascidos.
Para semear essas qualidades, não precisou dos recursos da política. Ao contrário, Willy Strack preferiu os atalhos da harmonia. E sem deixar qualquer respingo de animosidade, aqui viveu, no anonimato, ensinando a alunos a arte de bem viver e servir ao próximo”.

Bessa foi testemunha ocular: "Lá vem o bicho de fogo"!
Numa crônica publicada no jornal O Renovador de 27 de setembro de 1980, o saudoso músico e colunista Agenor Bessa com sua prodigiosa memória, e contemporâneo dos acontecimentos, relembrou a chegada dos primeiros automóveis e neófitos motoristas:

“Em dezembro de 1914 (O Albor registra a chegada em janeiro de 1915 N.A.) aqui eram desembarcados onde está edificado o atual Mercado Municipal, três automóveis, sendo que dois eram de cor preta e um de cor vermelha. 
Para pilotar aqueles veículos, vieram também na mesma viagem, os srs. Júlio Bergler, Willy Strack e Juvenal, que, infelizmente esqueci o seu sobrenome. O primeiro, era o proprietário da frota e os dois últimos, empregados.
Durante o dia em que esses carros desembarcaram ninguém sabia como chamar ditas máquinas, mas eram vistas com o mesmo espanto como se hoje chegassem à Laguna três discos voadores. Todos olhavam para eles, não digo assustados, mas admirados, porém, à noite, quando acenderam os faróis, já se dizia: Lá vem o bicho de fogo!
A garotada passou a dar às diversas peças os nomes que achava que deveria dar e, lembro-me bem que o volante era chamado de “orça”.
Passado algum tempo, o sr. Júlio Bergler, que logo foi apelidado de "Júlio Polaco” trouxe também, para o serviço de motorista, os srs. Aurélio Gomes, irmão do inesquecível amigo João Rodolfo Gomes, o “Joca Moreira”, e um outro Aurélio que não guardei seu nome completo e, apenas sei que veio de Brusque.
Dentro de certo tempo, o sr. Willy Strack, homem de senso prático e talhado para vencer, comprou os carros e contratou o sr. Júlio Bergler com os filhos José e Oscar, para atender o serviço de táxis na Laguna.
Tempos depois, outro filho do sr. Bergler, Júlio Bergler Júnior também prestou por certo período, os mesmos serviços”.

Os pioneiros motoristas
E assim transcorre o mencionado livro da prefeitura, página a página, enumerando os nossos pioneiros chauffeurs de automóveis e carroças, ainda grafando este termo em francês como então usual. Entre eles:

Dr. Paulo Carneiro, Carteira nº 3; 
Mário Bianchini, Carteira nº 4; 
Pedro Rocha, Carteira nº 8;
Dr. Aurélio Rótolo, Carteira nº 13; 
Humberto Zanela, nº 17; 
Francisco Fernandes Pinho, nº 19; 
Mário Remor, nº 30.
Antônio Dib Mussi, nº 67. 
Registro nº 3 do médico Paulo Carneiro, aos 26 anos, tendo como Perito Examinador Willy Strack.

Registro de Mário Bianchini, Carteira nº 4
Dos mais antigos e conhecidos motoristas da nossa Laguna, destacam-se João (Salame) Juvêncio Martins, que depois foi instrutor de gerações de alunos, com a Carteira nº 63; e Vitório Paladini, Carteira nº 75, motorista (ou chauffeur de praça, como queiram) durante décadas.
Vitório Paladini, Carteira nº 75, cujo Perito Examinador foi Willy Strack.

E quem terá sido o primeiro carroceiro cadastrado?
Lá está, para todo o sempre: Celestino dos Santos, 31 anos, casado, filho de João Maria dos Santos. Celestino recebeu a Carteira nº 2.
Eram dezenas de Cocheiros e Carroceiros em virtude do grande movimento do nosso comércio, porto e estrada de ferro.
Quem assina a rogo é Júlio Marcondes. Testemunhas: Oscar Bergler e Hilarião Pacheco. O exame foi prestado bem antes, em 7 de julho de 1923, na delegacia de Polícia, conforme caderneta apresentada.

5 comentários:

  1. Que beleza de pesquisa. Quantas histórias na nossa Laguna.
    Edison de Andrade

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  2. Seu Willy era um tipo quieto pouca fala muito alto ia lá comprar peças do distribuidor do Fusca aliás tinha todo tipo de peças automotivas

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  3. Pois então Valmir, e a gente isolado vai vivendo, se afastando do que venha acontecer, mas ao mesmo tempo vivendo este teu trabalho que nos trás bons momentos, memorias do que passou e conhecimento daquilo que nossa Laguna viveu. Parabéns pelas tuas pesquisas que nos faz pensar no que passamos.

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  4. Que preciosidade, meu caro Valmir.
    Retornei, como em uma Máquina do Tempo, ao velho e querido Campo de Fora.
    Das pessoas registradas por ti, experimentei um momento de saudade do Seu Willy. Como sabes, eu residia com meus pais bem em frente a oficina do mesmo, onde trabalhava o seu Wilke, pai do querido amigo João Carlos Wilke.
    Abraço Saudosista daqui, da maior cidade do Estado.

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    1. É mesmo de viajar no tempo. Quantas ricas personalidades tivemos na nossa Laguna. Que bom que conhecemos muitas delas e o legado que deixaram pra cidade.
      Abraços Mirandinha

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