quarta-feira, 13 de julho de 2022

Laguna já foi uma cidade industrial

 
Sabonete, sabão, vela, calçado, gasosa, cerveja, vinhos de frutas, caramelos e bombons, gelo, couro, fogos de artifício e enlatados são alguns dos produtos que já foram produzidos em nossa cidade. Além do café, arroz e pescado através de empresas de beneficiamento.
Dentre as fábricas que existiram constam três de produção de cigarros. Uma delas, que funcionou em pleno centro da cidade, lançou cinco marcas no mercado nacional.

Laguna já teve muitas indústrias, fábricas e beneficiamentos. As décadas de 1910 a 1950 foram pródigas na pujança econômica e social do nosso município.
O que refletiu, por exemplo, em sua arquitetura com a construção de sobrados e palacetes por parte de industriais, comerciantes e armadores. Período em que nosso movimentado porto escoava a rica produção, na ausência de rodovias. Havia muitos empregos e o capital circulava.
Fábrica de gasosas Gruner (1923)
A nossa cidade já teve fábrica de gasosa, primeiramente de Paulo e depois de Willy Arno Gruner. Uma charqueada na Barbacena, de Pinho & Cia.
Já teve três fábricas de cerveja: a Brandl, primeiramente de Antônio e depois de Otto Brandl. A Sulina, de Dolvino Felipe Martins, e outra de Eugênio Viana.
Fábrica de cerveja de Antônio Brandl, em 1887.

   Teve quatro fábricas de calçados: uma de Pio Machado, outra de Manoel Medeiros, uma terceira de Antônio J. Silva e a quarta de Paulo Zanini.
Laguna já teve três fábricas de sabão: de Machado & Cia, de José Fernandes Martins, e de Dário Gomes de Carvalho.
Uma indústria de vinho de frutas, enlatados e camarão seco, de Pedone & Cia. A fábrica de Dário Gomes de Carvalho, produzindo perfumes, sabonetes, sabão e velas.
Fábrica de engarrafamento de vinagre, a A. Pavan. De caramelos e bombons, de Dolvino Felipe Martins. De móveis, de João Wendhausen, de José Felipe, de Manoel Umbelino e de Arcângelo Bianchini.
Industrialização de couros, de Ernesto Bihel, na Carniça (hoje Campos Verdes).
Fábrica de gelo, de Teixeira & Irmãos, ali na rua Fernando Machado (rua do Rincão). Em 1915!
Fábrica de gelo em 1915.
Teve fábrica de torrefação e moagem de café, de Carlos Emilio Strauch (em 1908), a de Eduardo Silva (Café Ned), e a de Afonso Prates Silva (Café Salete).
Moagem e torrefação de café em 1908.
Fábrica de fogos de artifício de Custódio José Duarte (1900), de José Maria Calazans (1912), e de Joaquim Soares (1920), as três no bairro Magalhães; e de Fernando Coelho (1912), no bairro Campo de Fora.
Fábrica de fogos de artifício de Fernando Coelho, no Campo de Fora, em 1912.
Teve moinhos de arroz e de mandioca, além de muitas outras empresas de beneficiamento de pescados, como a Santa Marta e a Nipo Brasileira. A lista é variada e extensa. 

As fábricas de cigarros
Entre as fábricas que a Laguna já teve constam três de produção de cigarros.
A primeira delas, de menor porte, de propriedade de José de Araújo Teixeira produziu durante alguns anos, no começo do século XX a marca Diplomata.

A segunda fábrica, de Pedro Alves Gomes & Irmão, proprietários da Casa Amazona, além de vender produtos de armarinho, cristais e porcelanas, finos doces em caldas e secos, charutos, fumos, papéis e palhas para cigarros, cachimbos, piteiras, bolsas para fumo e cigarrilhas, produzia os cigarros de afamada marca Annita Garibaldi. Isso no ano de 1908!
Olha aí o nome da nossa heroína de Dois Mundos sendo utilizado já naquela recuada época em produto e peça de publicidade.
Casa Amazona produzia os cigarros Annita Garibaldi. Em 1908!
Fábrica ao lado do Museu
A terceira fábrica, Euzébio Nunes & Cia, foi fundada no ano de 1933 e pertenceu ao industrial Euzébio Nunes. Suas instalações eram naquele casarão onde já funcionou a Biblioteca Pública Romeu Ulysséa e prefeitura, situado ao lado do Museu Anita Garibaldi, na hoje Praça República Juliana (antiga Praça da Bandeira).
Casarão onde funcionou na década de 1930 a empresa Euzébio Nunes & Cia.
Em outubro de 1933 a empresa lançou no mercado cinco marcas de cigarro: Alaska, Nevada, Sarita, Bocanegra e Siri, além de fumo preparado Butiá.  A produção, em modernos maquinários importados, era de 23 mil cigarros/hora.

 Siri, Sarita e Bocanegra, três das cinco marcas lançadas em 1933 pela empresa Euzébio Munes & Cia.

O preparo e acondicionamento ficavam a cargo do sócio e irmão Álvaro Nunes, que havia trabalhado sete anos em São Paulo em fábricas de cigarros. Outro irmão, sócio e funcionário era Caetano Nunes.
Como ainda não havia lavoura de fumo na região, utilizou-se matéria prima oriunda do Rio Grande do Sul e importada da China e Turquia.
Em paralelo, Euzébio Nunes fez intensa publicidade aos agricultores da região sul do nosso estado, inclusive distribuindo sementes e folhetos explicativos. As sementes eram fornecidas pela Inspetoria Agrícola de Florianópolis, tendo como procedência a Estação Experimental do Ministério da Agricultura da Bahia.
Os folhetos distribuídos por Euzébio Nunes.
Em entrevista ao jornal lagunense A Cidade, edição de 7 de outubro de 1933, o industrial Euzébio era todo esperança:
“Até há pouco tempo essa indústria não era explorada nesta zona. Estou vivamente empenhado no cultivo do fumo A indústria do fumo em todas as suas ramificações será por nós explorada. A partir do ano que vem esperamos já utilizar matéria prima que a nossa região produzir”.
Já o jornal A República, de Florianópolis noticiou o fato, inclusive destacando preços e qualidades dos produtos recebidos de Euzébio Nunes que visitou a redação “em agradável palestra” e, claro, aproveitou para fazer o hoje chamado marketing. 
Aliás, o industrial Euzébio sabia usar a publicidade, o merchandising. No carnaval de fevereiro de 1934, o Bloco Carnavalesco de nossa cidade Pingos & Respingos trouxe como um dos carros alegóricos uma grande carteira de cigarros da marca Nevada.

O jornal destacou:
“O cigarro Nevada, ao preço de 600 réis, é uma mistura fraca, com acondicionamento impecável, nada deixando a desejar ao consumidor mais exigente”.
“O Sarita, para 500 réis, em elegantes carteiras azuis”.
Bocanegra e Siri, para 300 réis, saborosos cigarros destinados a um grande consumo. Os produtos da novel fábrica catarinense são realmente bem feitos e merecem a preferência do público”.

Numa velha crônica publicada no jornal Semanário de Notícias, o músico e maestro Agenor dos Santos Bessa, contemporâneo da fábrica, observou:
“Não digo que todas as marcas fossem muito boas, como o Sarita, o Siri e Bocanegra, mas o Nevada e o Alasca eram muito bons cigarros, tanto assim, que todo o sul do estado era mercado consumidor, principalmente o comércio de Tubarão”.
Tempos outros em que população e consumidores não tinham conhecimento dos malefícios do fumo à saúde. 

A produção durou apenas um ano
A produção durou cerca de um ano. Euzébio Nunes no ano seguinte, em 1934, informou pelos jornais que grande parte das sementes distribuídas pelo Ministério da Agricultura estavam falhadas. “Não sabemos ao certo se não nasceram por estarem estragadas ou se devido ao intenso frio deste inverno”, lamentou.
Como a produção da matéria prima murchou, a confecção dos cigarros tornou-se inviável com a continuação da importação de fumo dos grandes centros e também do exterior. A produção dos cigarros parou.

Em 1936 Euzébio Nunes foi eleito presidente da Associação Comercial da Laguna. Sua empresa, junto com seus sócios, continuou no ramo de exportação de mandioca, madeira e outros produtos primários para os mercados consumidores europeus.
Duas décadas depois, em 1955 surgirá a empresa Souza Cruz no município de Tubarão, utilizando-se de matéria prima produzida pelos agricultores (fumicultores) da região, com fonte regular e constante e a integração da etapa de processamento de fumo bruto à cadeia produtiva. Mas esse é outro capítulo.
Que fique aqui registrado o pioneirismo do industrial lagunense Euzébio Nunes lá na década de 1930 em incentivar a agricultura de fumo em nossa região sul e instalar sua fábrica do produto.

28 comentários:

  1. 'Laguna, terra do já teve!!! Parabéns pela matéria!

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  2. Geraldo de Jesus13/07/2022, 23:00

    Excelente pesquisa. Desconhecia várias dessas empresas. Bom relembrar o passado. Laguna precisa voltar a ser esse poderio.

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    1. Vanio Henrique15/07/2022, 19:09

      Faço minha as suas Palavras !

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  3. Tomei muito essa gasosa, principalmente a de fambroesa. Como sempre, ótimas matérias Valmir!

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    1. Renato, igualmente, quando eu li a crônica do Valmir - excelente, diga-se de passagem -, me veio à lembrança a época de garoto em Laguna e das festinhas de aniversário lá em casa, onde eram disputadíssimas as gasosas Gruner, principalmente as de framboesa (atraente pela cor vermelha) e as de limão. Bons tempos. Abraço.

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  4. Ótima matéria, mas deixa um "vazio" no coração, pelo Laguna já teve.... Mais que a dependência do porto, foi a falta da criatividade para a continuidade, visto que Tubarão que não tinha esta facilidade, logo tomou a rédea do desenvolvimento.

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    1. Agradeço a leitura Zuleida. Dá um vazio sim constatar o que Laguna já foi. Voltará a ser um dia? Fica a questão.

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  5. Parabéns Valmir!!!👏🏻👏🏻👏🏻
    Suas matérias são espetaculares…. O triste é saber que Laguna foi cidade do Já Teve!
    Grande abraço!

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  6. Muito legal a matéria sou lagunense a sessenta anos sei muita coisa da nossa cidade mais nada disso eu sabia show

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  7. Edison de Andrade14/07/2022, 11:25

    Valmir, matéria ótima para as novas gerações lerem, inclusive os novos políticos de Laguna para que saibam, conheçam um pouco da nossa história e façam alguma coisa pra nos tirar desse marasmo. Parabéns

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    1. Agradeço a leitura. Bem isso, para que as novas gerações conheçam essa Laguna.

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  8. Parabéns pelo excelente editorial e nos deixando informados e orgulhosos da Laguna de outrora.

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  9. Parabéns, muito esclarecedor.
    O melhor para todos nós hoje é projetarmos o futuro de nossos filhos. E recuperar as perdas do passado

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  10. Excelente matéria !
    Grande pesquisa e orgulho de ser lagunense..
    "Ad Meriden "Brazilian Duxi

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  11. Excelente matéria !

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  12. Adorei saber tudo isso.

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  13. Guedes dá um show. Com sua caneta histórica, traz à tona os momentos de Laguna e Lagunense à memória de nossa sociedade. Parabéns ao Jornalista e sua assessora.

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    1. E como tem história a nossa Laguna, Éder. Agradeço a leitura e comentário.

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  14. Victor Gruner15/07/2022, 06:28

    Minha família sempre comentou sobre como meu avô (Jacy Pinho Gruner) chegava com caixas da gasosa em casa e eles adoravam. Pena que não tive a oportunidade de experimentar.

    Excelente matéria e obrigado por compartilhar a foto da marca da fábrica do meu bisavô.

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    1. Agradeço a leitura. Bom ter um depoimento de um neto da família.

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  15. Felicitações pela Excelente Matéria, só faltou falar da Fábrica de Café Salete do Afonso Prates, meu Pai Trabalhou lá por Onze anos, cresci alí na mesma Rua, Saudades !

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  16. Valmir, não só a variedade de produtos da nossa saudosa força industrial, mas, antes, a criatividade, talento e empreendedorismo do lagunense de então faziam a diferença, com reflexos até na configuração arquitetônica da urbe. Sim, Laguna já teve um passado brilhante com uma economia destacada, e que agora revives, para o nosso deleite, nostalgicamente. Abraço.

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    1. Agradeço a leitura meu amigo e os comentários sempre pertinentes.

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  17. Sim, Laguna foi uma cidade acolhedora, em Criciúma não tinha Maçonaria, eles se reuniam em Laguna, e assim tbm Casa Espírita.

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  18. Valmir.... muito boa sua matéria sobre o passado indusrial da nossa Laguna, que foi tão bem representado por inúmeras indústrias que mesmo hoje seriam de bom porte e de diversos ramos de negócio. Das citadas, lembro muito bem da fábrica de gasosas do Gruner... da qual tive algumas oportunidades de tomar. Quanto a fábrica de café lembro do Café Ned (Eduardo Silva) na rua Fernando Machado no centro e do Café Salete (Afonso Prates Silva no Magalhães. Também, tinha uma pequena fábrica de calçados chamada Canário na rua João Pessoa no Magalhães (perto do Colégio Stela Maris, defronte a minha casa), na qual trabalhavam 2 sobrinhos do proprietário...que eram os irmãos Morais... um deles que tinha o apelido de Quico e o outro que é o nosso conhecido médico Dr. Airton Morais... estes jovens na época já batalhavam bastante. Quanto as fábricas de cigarros, meu sogro Luiz Nicolazzi Junior (Seo Lulu, falecido em 03/01/2018 com 102 anos) falava que tinha fumado diversas marcas destes cigarros, fabricados pelo ndustrial Euzébio Nunes, sendo considerados "bons" naquele tempo. Agora, depois de tanto tempo decorrido fico me perguntando o que falta aos empreendedores de hoje para que sigam o exemplo da velha guarda, que se mostrou tão competente quando tudo era muito mais difícil e sem nenhum financiamento ou outro incentivo.
    Grande abraço do Adolfo Bez Filho - Joinville / SC.

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