Sábado de Aleluia. Contam os relatos bíblicos, como todos sabemos, que Judas
Iscariotes, um dos apóstolos de Jesus, foi o responsável por entregar Cristo
aos soldados romanos que o levaram para ser crucificado.
Penso que não exista mais a malhação ao Judas, a não ser, quem sabe, nas comunidades do interior. Uma velha tradição trazida à América Latina por espanhóis e portugueses.
Aqui pelo Centro e bairros da Laguna não lembro de nos últimos anos ter presenciado a brincadeira.
Um beijo no rosto foi a maneira que Judas
indicou conhecer Jesus.
Recebeu 30 moedas pelo dedo-durismo, no que ficou
representando um dos maiores casos de traição da história da humanidade.
Os fiéis católicos celebram o sábado como de
Aleluia, marcando a morte de Cristo. No domingo, Páscoa, o clima já é de festividade,
anunciando a ressurreição de Jesus.
Penso que não exista mais a malhação ao Judas, a não ser, quem sabe, nas comunidades do interior. Uma velha tradição trazida à América Latina por espanhóis e portugueses.
Aqui pelo Centro e bairros da Laguna não lembro de nos últimos anos ter presenciado a brincadeira.
Saul Ulysséa em seu livro "Laguna de 1880", diz,
à página 99:
“No
sábado de aleluia, ao amanhecer, inúmeras pessoas percorriam as ruas, para verem
os judas. Era rara a que não os tinha. Feitos com certo cuidado e arte, tendo
muitos deles um cartaz sobre o peito, com dizeres alusivos a alguma pessoa ou
algum fato.
Ao
romper a Aleluia, a garotada malhava e despedaçava os Judas sob infernal
gritaria, terminando por despedaça-los ou incendiá-los. Viam-se por vezes,
Judas dependurados nas vergas ou no beque dos navios. Estes cruzavam as vergas,
endireitando-as ao romper a Aleluia, tangendo então os sinos dos navios”.
Isso foi há muito tempo, no século XIX.
Mas ainda em minha infância, década de 60 e
70, do século passado (ui!) anualmente no sábado de Aleluia, na rua Voluntário
Benevides, eram dependurados nos postes dois ou três Judas.
Havia organizadores para a tarefa que, ao
longo da semana, recolhiam da vizinhança os apetrechos para montar o boneco.
No morro, seu Plínio (Lordo) Souza, com seu
irmão Nelson e anos depois, a filha Edna. Fundadores e componentes da Escola de Samba Infantil Amigos da Onça.
Mas muita gente moradora na rua, colaborava.
Um doava surrado terno; outro entrava com
velhos sapatos ou uma camisa social puída. O boneco ia sendo montado e
costurado no estilo Frankenstein, por partes, sem seguir qualquer estilo ou modismo.
Por todo o bairro Magalhães também era assim,
com destaque para o Judas da Pracinha Souza França.
No bairro Campo de Fora, perto do Clube Anita
Garibaldi, lembro-me de também ter presenciado a malhação de Judas.
Vez ou outra alguém, de partido adversário,
obviamente, colava uma foto de um político da situação e em evidência, na cara do boneco, o
que criava desavenças e muitas vezes o pau fechava mesmo; ou então afixava ao peito uma tabuleta com o nome do
dito político ou de alguém ranzinza do bairro, furador de bolas de futebol da gurizada ou um conhecido fofoqueiro.
Enfim, lá pelas 10 da manhã, meio-dia ou às 5 da tarde
– o horário variava - a um sinal, crianças, arrancávamos, destrinchávamos, pernas e braços do boneco, numa
algazarra ou "gritaria infernal", como nos conta Ulysséa. O pessoal adulto acompanhando, fiscalizando - para não haver furto do boneco inteiro por parte de alguém - às gargalhadas e
avisando, provocativo, que o dinheiro – moedas e notas em papel no então
cruzeiro - estavam na cabeça do bicho, sendo o prêmio melhor a ser alcançado.
Algumas crianças com mais idade, traziam varas para logo atingir o
boneco, já que sempre dependurado bem no alto dos postes de difícil alcance para
nós.
O resto era palha, amendoim, balas e pirulitos
disputados avidamente pela gurizada.
Não vi, mas contam que certa vez, no
Magalhães, uns sacanas rechearam um Judas com dezenas de sapos recolhidos na
noite anterior, na várzea onde hoje é o Alagamar (Vila Vitória), ou na rua João Henrique (rua do Valo), não sei bem.
Imaginem a surpresa, alvoroço e decepção das crianças
no dia seguinte...
Este Judas aí da foto, é de 1997, e penso que
dos últimos malhados no poste da Rua Voluntário Benevides, perto da casa de meus pais, e que registrei para
posteridade.
Fico pensando: Hoje, quem seriam os Judas em
nossas vidas? Quem seriam os Judas de nosso país, de nosso estado, de nossa cidade?
Os traidores que prometeram em todas as épocas
muito trabalho, suor pelo povo, ética, combate à corrupção e que tão logo instalados no poder esqueceram
rapidinho de suas promessas? Que mergulharam de cabeça naquilo que um dia juraram combater. Que multiplicaram seus patrimônios, incluindo caríssimos imóveis e luxuosos automóveis.
Quantos neste Brasil varonil, nos bastidores
de gabinetes, em encontros suspeitos por aí, em hotéis, motéis e no interior de veículos, estarão recebendo as trinta moedas
de prata? A beijar as faces de familiares, amigos, traindo-os e entregando-os aos verdugos? A
receber o dinheiro de negociatas, de comissões por obras superfaturadas? Montando
caixas 2 para futuras campanhas? Enriquecendo-se ilicitamente? Mensalinhos e mensalões, lava-jatos e zelotes, em todas as esferas.
Milhões, bilhões depositados em suas contas ou
em nomes de laranjas e até no exterior. Contratos de gaveta, dinheiro desviado à saúde, educação, segurança.
São lembranças, indagações e reflexões que faço
neste sábado de Aleluia.
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