Não se sabe o
dia e ano em que tudo começou.
Foi numa noite,
quebrando o silêncio, quando toda a cidade ouviu gritos idênticos a um bebê chorando. Só que os choros e gemidos vinham do alto, dos céus. Os mais corajosos saíram
às ruas em busca da origem.
No início nada
foi avistado e nas noites seguintes os ruídos assustadores se repetiram. O que seria?
Esta é uma
história que atravessou gerações, contadas pelas famílias lagunenses.
Era um tempo das rodas de
conversas de nossos pais e avós, quando as famílias ainda se reuniam nas salas das
casas e não havia a hipnotizadora televisão e muitos menos, é claro,
viciantes celulares.
Luzes bruxuleantes
Casas somente
iluminadas por luzes provenientes de fracas lâmpadas ou de bruxuleantes velas e/ou
lamparinas que jogavam no ar, além do cheiro de cera e querosene, assustadoras
sombras nas paredes.
Estava pronto o
cenário ideal para os contadores de histórias.
E quanto mais
assustadores os fatos narrados, mais provocavam exclamações de pavor,
principalmente entre nós crianças que a tudo ouvíamos, curiosas, atentas, sentadas
pelos cantos ou atrás das portas, escondidas.
Quem dormiria
depois de ouvi-las?
O porto da
Laguna ainda estava localizado no centro da cidade. Em nosso cais aqui chegavam e daqui
partiam navios para Florianópolis e também para o
Rio de Janeiro, então Capital Federal.
E nesse mesmo
centro, hoje chamado de Histórico, moravam centenas de famílias com suas
extensas proles.
Choro e gemidos vinham do alto
Não se sabe o
dia em que tudo começou.
Era início de
outono e uma friagem chegava do Sul fazendo com que todos se recolhessem mais
cedo às suas casas. As estreitas ruas da cidade Juliana ficavam desertas a
partir das 18 horas.
Foi numa noite, quebrando
o silêncio, quando toda a cidade ouviu gritos idênticos a um bebê chorando.
O choro e gemidos vinham do alto, dos céus. Os mais corajosos saíram às ruas em busca da origem.
No início nada
foi avistado e nas noites seguintes os ruídos assustadores se repetiram. O que seria?
Especulações
Daí começaram as
especulações por parte do povo.
Havia quem acreditasse se tratar de uma alma
penada ou de uma criança que tivesse morrido sem ser batizada.
Houve quem dissesse que era uma bruxa a bordo de sua vassoura, assustando os
moradores.
Era próprio de crendices
daqueles tempos. Orações e promessas foram feitas pelos mais crentes. Velas
foram acesas nos oratórios.
Passadas algumas
noites, alguns moradores postados nos parapeitos de suas janelas ou por trás das
vidraças distinguiram a sombra do que parecia ser um enorme pássaro.
Ele voava do
Morro da Glória ao Morro da Matriz, atrás da igreja e depois até ao Morro do
Campo de Fora, fazendo com que os moradores daquele bairro também se
assustassem.
Pouco tempo
depois o grande pássaro retornava pelo mesmo trajeto com seus gritos, choros e sinistros
pios que só eram ouvidos à noite.
Durante o dia nada era visto nem ouvido
Os mais
entendidos e letrados diziam pelos cafés, bares, boticas e barbearias, tratar-se de alguma ave desconhecida, migratória, perdida de seu bando e que teria sofrido alguma perturbação e ficado por aqui, voando somente à noite, de um morro a outro, confusa.
Mas ninguém sabia sua
origem, nem do que se alimentava.
Ornitólogos e passarinheiros
antigos da cidade foram chamados e consultados, mas todos desconheciam a existência de
tal ave.
Não constava de suas enciclopédias.
Grupos de
rapazes foram formados para percorrerem durante o dia as matas dos morros em
busca do pássaro. Arapucas foram armadas. Mas ninguém conseguiu avistá-lo nem capturá-lo.
E na cidade silenciosa, continuavam os voos, pios e o choro de bebê recém-nascido vindos do alto, juntamente com enorme sombra que se projetava fantasmagórica nos vidros de janelas e telhados.
Preso na armadilha. Ou fugiu
Há dois finais
para essa história. Não se sabe qual deles é o verdadeiro.
Contam que alguns
membros do Clube Recreativo Almirante Lamego, cuja sede ficava situada nos
fundos do hoje Ceal, na rua Willy Strack, teriam preparado uma armadilha,
deixando a porta aberta à noite com uma lamparina acesa em cima de uma mesa.
O pássaro, em
meio à escuridão, atraído pela luz, entrou no recinto e a porta foi rapidamente
fechada por uma pessoa que ficou aguardando por de trás.
Foi colocado numa gaiola, mas a ave não mais emitiu sons e nem se alimentou e por isso teria
morrido.
Outra versão é
que o pássaro teria sido realmente aprisionado na gaiola, mas misteriosamente
no outro dia quando o pessoal chegou à sede do clube para fotografá-lo, e abriu a porta, a gaiola estava aberta e ele tinha sumido.
Ninguém nunca
soube explicar o ocorrido.
Mais um mistério
nessa história.
****
Pássaro-Lira
Hoje, graças à internet
fica-se sabendo que provavelmente era um Pássaro-Lira proveniente da Austrália.
Como chegou à nossa região é mais um mistério.
No Zoológico de
Taronga, situado em Sidnei, naquele país, um exemplar dessa ave surpreendeu a todos imitando perfeitamente
um choro de bebê.
Funcionários desconhecem
como o pássaro aprendeu a imitar o som já que o zoológico esteve fechado
durante toda a pandemia.
Eis o vídeo:
Magnífico! A natureza só surpreende.
ResponderExcluirQue história. E que medo na época.
ResponderExcluirImagine no silêncio da noite esse bicho gritando no mato e nos telhados com a escuridão da época. Eu saia correndo e trancava bem a casa. Cruzes.
ResponderExcluirValmir, já dá pra reunir todas essas ótimas histórias e publicar um novo livro. Vamos lá? Muito bom.
ResponderExcluirValmir... esta nossa Laguna é mesmo um capítulo à parte, pois, ao longo do tempo já foi até "palco" de histórias estranhas... como esta relativa aos gritos e choros misteriosos. Quanto ao Pássaro-Lira proveniente da Austrália, creio que deva ter vindo a bordo de um navio e, depois de fugir (!!) deve ter encontrado abrigo nas matas que recobrem os morros da cidade.
ResponderExcluirGrande abraço do Adolfo Bez Filho - Joinville / SC.