quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Há 90 anos o Zeppelin cruzou os céus da Laguna

 
Foi logo pela manhã quando ele apareceu nos céus da Laguna. Primeiro foi ouvido o forte ronco de motores. Depois um enorme vulto prateado escuro em forma de charuto se projetou nos ares, em marcha vagarosa e voo baixo.
Na praia do Mar Grosso e nos morros as pessoas se aglomeravam apreciando o inédito espetáculo e davam vivas a sua passagem ao sul do bairro Magalhães.
Depois o estranho objeto aéreo sumiu em direção ao sul.
 
Era uma sexta-feira, 29 de junho de 1934. O tempo amanheceu bom em nossa região, passando a instável com chuvas e trovoadas no decorrer do dia.
O Balão Graf Zeppelin. Foto: Wikipédia.
A temperatura máxima naquele dia seria de 23.7° e a mínima de 18.2°. Os ventos eram de quadrante Norte, rondando para o quadrante Sul, sujeitos a rajadas fortes.
Laguna amanheceu curiosa, olhando para o céu em busca do grande balão prateado em forma de charuto, uma máquina aérea que rasgava o firmamento, cortando a linha do horizonte numa imagem inesquecível.
Muitas pessoas subiram ao Morro da Glória, ainda denominado Morro do Semáforo ou do Pau de Sinal.
Outras foram à Praia do Mar Grosso em busca de uma maior proximidade para assistir uma imagem nunca vista.
Os jornais e algumas emissoras de rádio do eixo Rio-São Paulo já haviam noticiado que a aeronave viria da Alemanha, passaria por Pernambuco e Rio de Janeiro e rumaria para a capital da Argentina. 

Finalmente surge o Zeppelin
A expectativa era grande. Por volta das nove horas da manhã ruídos de motores foram ouvidos nos ares lagunenses e um grande objeto prateado escuro surgiu, chamando a atenção de todos.
Era o Balão dirigível Graf Zeppelin D-LZ130 em sua viagem de ida a Buenos Aires.
O Graf Zeppelin. Wikipédia.
O Zeppelin passou, sobrevoando pela ponta sul do Magalhães, proximidades da Ponta das Pedras, fazendo algumas evoluções, como que saudando à terra juliana.
Era um enorme vulto a se projetar nos ares, em marcha vagarosa e voo baixo.
Depois sumiu em direção ao sul.
Foi um espetáculo inédito, com muita gente falando nele com entusiasmo.
E durante muitos dias foi tema de conversas nos lares, boticas, cafés e barbearias da nossa cidade.
O povo já se referia ao balão como “Zé Pélim”.
Dois dias depois, o jornal lagunense Correio do Sul noticiou o fato: 

“Antes de ontem, às 9 horas da manhã, a população desta cidade teve ocasião de presenciar a passagem do Graf Zeppelin” quando se dirigia para Buenos Aires.
Apesar do dirigível passar um tanto por fora, tornou-se bem visível ao defrontar, rumo ao sul, a Ponta das Pedras, no Magalhães.
Grande foi o número de pessoas que afluiu aos morros e à praia para apreciar a bela aeronave”.

Jornal lagunense Correio do Sul de 1° de julho de 1934.

Características técnicas
Os mais letrados contavam sobre a aeronave, discorrendo sobre seus dados técnicos:

O Balão Graf Zeppelin era uma invenção de Graf (Conde) Ferdinand von Zeppelin, general e aeronauta alemão.
O Balão dirigível havia sido construído na cidade de Friedrichshafen na Alemanha em 1928 com as seguintes características:
Cumprimento: 235 metros
Diâmetro: 30 metros
Alimentado a gás hidrogênio e impulsionado por cinco motores “Maybach” VL2 de 12 cilindros com capacidade para 2.750 HP. (580 HP cada um).
Carcaça de alumínio, revestida por uma tela, tendo em seu interior 60 pequenos balões independentes.
Velocidade por hora de 100 a 110 quilômetros. Autonomia de voo de 11 mil quilômetros.
Possuía capacidade para 20 passageiros e 15 tripulantes.
Possuía aparelho de radiotransmissão e recepção e rádiotelégrafo.
Em seu comando estava Hugo Eckner e seu ajudante Leman, os dois experientes técnicos em aeronavegação.

Até 1934 já havia feito cerca de 200 viagens a várias partes do mundo, inclusive ao Polo Norte.
Em maio de 1930 pela primeira vez realizou a travessia do Atlântico Sul em visita ao Brasil, inaugurando uma rota regular de passageiros e de serviços postais.
Somente no ano de 1932 já havia feito nove viagens ao Brasil. E várias outras nos anos seguintes.
Até um grande Hangar para dirigíveis foi construído no Rio de Janeiro, o Bartolomeu de Gusmão, hoje denominado Base Aérea de Santa Cruz.
Jornal lagunense Correio do Sul de 22 de julho de 1934.
A viagem a Buenos Aires
O Zeppelin soltou as amarras de Friedrichshafen na Alemanha, às 20h30 do dia 24 de junho de 1934, com destino à América do Sul.
Levava um passageiro para Recife, um para o Rio de Janeiro e nove para a capital da Argentina, além de 177 quilos de correspondência e 229 quilos de carga.
Entre os passageiros estava o pianista alemão Willy Kern que daria um concerto em Buenos Aires.
No dia 27 já estava no Recife, numa viagem de 62 horas.
No dia 28 chegou ao Rio de Janeiro e no mesmo dia partiu em direção ao Sul, passando por Laguna no dia seguinte, 29, conforme relatado acima.
Florianópolis também aguardava a passagem do Zeppelin em sua ida para Buenos Aires.
Mas uma mudança de tempo repentina, com forte vento sul e chuva impediu que o ilhéu avistasse a aeronave que passou a distância de 15 milhas do litoral.
O jornal O Estado, de Florianópolis, indagava: Cadê o Zeppelin?...
Jornal O Estado de 29 de junho de 1934.
Somente na viagem de retorno é que os moradores da capital do estado puderam contemplar o Zeppelin.
Outras cidades catarinenses e gaúchas também registraram a passagem da aeronave, como Itajaí, Blumenau e Brusque, Joinville, Porto Alegre e Rio Grande.
O Zeppelin saiu de Buenos Aires em sua viagem de retorno às 11h do dia 30 de junho, com 23 passageiros, além de correspondência postal para o Brasil e Europa.
No dia seguinte já estava no Rio de Janeiro e no dia 2 às 17h35 saiu em direção ao Recife levando 1 passageiro para esta cidade e 21 para a Europa.
Finalmente no dia 4 de julho saiu do Recife para a Europa às 7h35.

O Zeppelin e o ronco dos motores
Abaixo, cenas raras do dirigível Graf Zeppelin em vídeo do youtube. Ouçam o ronco dos motores da aeronave que nossos antepassados testemunharam quando de sua passagem por aqui.

E abaixo, filmagem do Zeppelin quando de sua primeira passagem pelo Rio de Janeiro, em 1930.

Fim das viagens com dirigíveis
Parecia que seria uma nova opção para viagens comerciais de longos percursos.
Mas três anos depois, um acidente de grandes proporções, pôs fim ao sonho.
Em 6 de maio de 1937, durante manobras de pouso em Nova Jersey, nos EUA, outra aeronave, o dirigível LZ 129 Hindenburg pegou fogo, matando 36 pessoas que estavam a bordo.
Um ano depois do acidente as viagens e operações com dirigíveis foram encerradas em definitivo.

6 comentários:

  1. Muito legal, não sabia que o Zeppelin tinha passado em Laguna.

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  2. Bom dia.
    Parabéns pela (como sempre) bela pesquisa histórica.
    Eu também não sabia que o Zepelim tinha sobrevoado Laguna.
    Meu pai deve ter visto.

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  3. Imaginem a euforia do povo , vendo o Zeppelin passar. Quantos sonharam em fazer a viagem? Reportagem muito legal.

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  4. Geraldo de Jesus30/08/2024, 12:06

    Fico pensando a turma toda, nossos avós subindo o morro ou correndo pra praia pra ver a novidade. Até eu iria.
    Deve ter sido o máximo. Sem tv, internet, o rádio só começando.
    Muita gente nem sabia ler.
    Que visão deve ter sido.
    Não sabia que o balão tinha passado por aqui. Veja só!

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  5. Valmir, como estou há 38 anos em Joinville, sabia das memoráveis passagens do Graf Zeppelin LZ 127 (1934) e do Hindenburg LZ 129 (1936), por aqui, pois os fatos de tão marcantes, foram transmitidos às gerações. O que eu não sabia era que o mesmo Zeppelin, aquele enorme charuto voador, símbolo da propaganda nazista, na mesma época também houvera passado pelos céus da nossa Laguna de 1934, ostentando, no seu leme, a marcante suástica. Valeu o registro. Abraço

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  6. Valmir... parabéns pela excelente matéria sobre o Zeppelin, sobrevoando a nossa terra. Também, gostaria de complementar o comentário do meu xará (Adolfo Silva, que também mora há muitos anos em Joinville), que aqui a "visita" do Hindenburg ocorreu em 01/Dezembro/1936 no início da manhã, sendo que outras cidades próximas como, Blumenau, Brusque, Indaial e Jaraguá do Sul... também tiveram a oportunidade de avistar o dirigível. Tenho um bom material de época escrito e também registrado em filmes, sendo que ao que parece muitas pessoas de Joinville e Blumenau sabiam com antecedência deste evento com data e hora. Conforme você relata, alguns meses depois (em 06/Maio de 1937) esta bela aeronave sofreu um acidente terrível e das 97 pessoas a bordo 36 faleceram. Uma curiosidade é que o nosso ex-governador Aderbal Ramos da Silva (de saudosa memória), quando do seu casamento com a Dona Ruth Hoepcke da Silva em Abril de 1936, os recém casados ganharam como presente Lua de Mel... da Donna Anna Hoepcke (sogra de Dr. Deba), uma viagem à Europa. A ida foi num navio transatlântico e o retorno para o Brasil foi realizado no Graf Zappelin. Claro que pela quantidade pequena de passageiros, imagino que tenha sido um belo presente.
    Grande abraço do Adolfo Bez Filho - Joinville / SC.

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