quinta-feira, 16 de novembro de 2023

O adeus a Colombo Machado Salles

 
“Sou criado com as forças do nordeste lagunense; fui criado com a têmpera do pirão de mandioca e com o fosfato da cabeça do bagre”.
(Colombo Machado Salles)

Falecido no último dia 14 em Florianópolis, aos 97 anos, o ex-governador de Santa Catarina, o lagunense engenheiro Colombo Machado Salles deixa um legado de vida e de exemplo para todos nós. Nasceu em 20 de maio de 1926.
O Ex-governador Colombo Machado Salles quando da sessão solene da Câmara de Vereadores da Laguna em sua homenagem em 28 de março de 2008. Foto: Geraldo Luiz da Cunha (Gê).
Quem o conheceu sabe de sua honradez, de sua honestidade, sua inteligência e sabedoria.
Dotado de fino humor, conquistava logo o interlocutor com suas conversas e conhecimentos.
Era verdadeiramente um humilde, qualidade presente somente em espíritos iluminados.
Um símbolo de probidade e correção na história política-administrativa de Santa Catarina, através de seu Projeto Catarinense de Desenvolvimento, quando governador.

A entrevista para o livro
Em 1994 o entrevistei para meu primeiro livro: “Porto da Laguna, a Luta de Um Povo Traído”.
Na época, aos 68 anos, era ele o engenheiro responsável pela construção da Beira Mar Sul, juntamente com o Túnel Antonieta de Barros.
Me recebeu no fim de uma tarde no próprio canteiro de obras, ali no bairro Saco dos Limões. Era uma conversa para durar apenas meia-hora. Durou mais de duas.
Quando fazia menção de me retirar, preocupado pelo adiantado do horário, doutor Colombo prolongava o papo, contava mais um de seus causos da infância e juventude na Laguna, indagava por personagens nossos conterrâneos, queria saber como andava a política na terrinha...
À ocasião lhe ofereci uma rara foto onde apareciam antigos funcionários do nosso porto.
Se emocionou quando reconheceu no registro fotográfico o seu pai, Calistrato Müller Salles, administrador do porto na década de 40. Salientou que não possuía a foto em sua coleção particular, e que certamente, desde então, entrou para seu álbum familiar de recordações.

Momentos
Todos os anos, até certo tempo atrás, quando problemas de saúde o impediram, vinha sempre à Laguna, principalmente nas festividades em honra a Santo Antônio dos Anjos. Seu filho Marcelo ao volante sempre o trazia.
Vinha para à Transladação do Padroeiro e, comumente ficava em pé à porta da Matriz quando da realização da novena.
Em uma das ocasiões, em 1999, foi o orador da noite e o fotografei no púlpito, bem defronte ao altar de Santo Antônio dos Anjos.
Ex-governador Colombo Machado Salles orador da novena de Santo Antônio dos Anjos em 4 de junho de 1999. Foto: Valmir Guedes Júnior.

Não era usual Colombo Salles frequentar o famoso coquetel na Casa Paroquial, enquanto foi realizado. Preferia ficar conversando com o povo na rua ou no interior do Centro Social e Cultural. Era muito querido e congratulado por pessoas de variadas faixas etárias.
Ex-governador Colombo Machado Salles e a esposa Dayse Werner Salles na novena de Santo Antônio dos Anjos de 4 de junho de 1999. Foto: Valmir Guedes Júnior
Não me lembro de um ex-governador ser tão cumprimentado e querido como foi Colombo Salles.
Às vezes, quando estava por aqui a passeio, aceitava um convite para rápidos coquetéis, um cafezinho para a fácil prosa nas casas de amigos e conhecidos que moravam nas imediações da Praça Vidal Ramos.
Professoras Amélia Baumgarten Baião, Terezinha Maria Spillere Negro com o o ex-governador Colombo Machado Salles, após a novena em honra a Santo Antônio dos Anjos em junho de 2012.

Lenira Amboni Nicolazzi e o ex-governador Colombo Salles, após a novena em honra a Santo Antônio dos Anjos, em junho de 2012. Foto: arquivo pessoal.

Outra ocasião, quando de uma noite literária na Assembleia Legislativa, riu muito com a Julita ao lembrar e narrar as peripécias de infância e juventude na Laguna com seu amigo Aliatar Barreiros (tio da Julita). Fotografei o momento sorridente.
Ex-governador Colombo Machado Salles e Julita da Silva Barreiros Guedes. Foto: Valmir Guedes Júnior
Às vezes também pernoitava na Laguna e no outro dia circulava sozinho pela cidade.
Certa vez o encontrei bem cedo na manhã de um domingo. Estava parado defronte a sua antiga casa na rua Duque de Caxias, onde morou e passou sua infância e adolescência. Estava absorto em seus pensamentos, nas lembranças, e mantendo um sorriso nos lábios.
Parei, o cumprimentei e indaguei sobre a saudade.
Me respondeu que ali naquela casa foi muito feliz, nela passou seus verdes anos e onde estudava muito, preparando-se para o futuro. Tinha saudade de seu pai Calistrato e de sua mãe dª Bertha.
Respeitei seu momento íntimo, me despedi e deixei-o com seus pensamentos e nostalgias.
Colombo Machado Salles com a esposa Dayse Werner Salles num baile no Clube Congresso Lagunense na década de 1950. Foto: Álbum de Família.

No dia da posse de Colombo Salles como governador de Santa Catarina, em 15 de março de 1971, uma caravana de amigos lagunenses compareceu ao evento para prestigiá-lo. Aqui numa foto (em baixa resolução) ao lado do prédio da Assembleia Legislativa. Ao fundo, no alto, o Imperial Hospital de Caridade.

Em 15 de março de 1971 ao receber o cargo do governador Ivo Silveira, tendo ao seu lado a esposa Dayse Werner Salles. Divulgação Palácio do Governo. Ao fundo, no meio, o radialista Dakir Polidoro.

Discursando quando da inauguração em 1971 do prédio da Agência do Banco do Brasil na Laguna, na Praça Vidal Ramos. Na foto, logo atrás, o radialista Waldemar Manoel de Souza com o microfone transmite o ato solene pela Rádio Difusora. No lado direito o então prefeito da Laguna, Saul Ulysséa Baião. No fundo o gerente da agência, Cláudio Ramos, além de José Carlos Pacheco, chefe de gabinete e secretário particular do governador, entre outras autoridades, funcionários e convidados.

Rogério Ulysséa e Colombo Machado Salles, quando do lançamento do livro "Laguna Memória Histórica", de Ruben Ulysséa, no Clube Congresso Lagunense em 14 de janeiro de 2005. Aos fundos, aguardando os autógrafos, o ex-prefeito (1983-1988) João Gualberto Pereira e o ex-juiz da Comarca da Laguna Erwin Rubi Peressoni Teixeira.

Ex-governador Colombo Machado Salles, a filha Maria José, Edson (Bito) Remor Guedes e as irmãs Dayse Werner Salles e Ema Werner Miranda, no Teatro Álvaro Carvalho (TAC), Florianópolis, quando de uma apresentação do Coral Santo Antônio dos Anjos em 20 de julho de 1999. Foto: Valmir Guedes Júnior.

Revista do Sul, de Itajaí, nº 208, de 1971, traz na capa uma fotomontagem colorida do casal Salles, tendo ao fundo o centro da cidade da Laguna visto lá de cima do Morro da Glória, por ocasião da posse do governador lagunense. Acervo: Valmir Guedes Júnior.

Uma raríssima foto que fiz em 14 de janeiro de 2005, no Clube Congresso Lagunense reunindo os ex-prefeitos da Laguna Juaci Ungaretti, Saul Ulysséa Baião, Mário José Remor, ex-governador Colombo Machado Salles, João Gualberto Pereira, o prefeito da Laguna naquela ocasião Célio Antônio e o desembargador Norberto Ulysséa Ungaretti. Foto: Valmir Guedes Júnior.
Em 30 de maio de 2001, no Hall da Assembleia Legislativa, quando do lançamento do livro "Pedra Lisa", do ex-deputado Nelson Pedrini. Na foto pode-se observar aguardando na fila de autógrafos, o então Conselheiro do Tribunal de Contas de SC, José Carlos Pacheco (e chefe de gabinete e secretário particular de Salles em sua gestão, o ex-governador Colombo Machado Salles, além do promotor de Justiça Ruy Wladimir Soares de Souza. O ex-deputado Pedrini foi líder de governo no período de mandato de Colombo Salles e presidente da Assembleia Legislativa no biênio 1971-1972. Foto: Valmir Guedes Júnior.

Presidente do Tribunal de Contas do Estado, José Carlos Pacheco, governador Luiz Henrique da Silveira, Colombo Machado Salles e o jornalista Moacir Pereira, autor do livro "Colombo Salles - O Jogo da Verdade", Editora Insular, quando do lançamento da obra em 2007 na Capital do Estado. Foto: Divulgação.

Ex-governador Colombo Machado Salles em 10 de maio de 1997, discursa em solenidade de homenagens com o Título de Sócio Honorário do Clube 3 de Maio, no Magalhães. Foto: Valmir Guedes Júnior

Político famoso na tela - Uma historinha
Uma história que sempre gostava de contar – e ria, ria muito quando a narrava -, foi quando certa vez, há muitos anos, sozinho, adentrou ao Museu Anita Garibaldi.
Subiu ao primeiro andar e ficou observando uma pintura sua que lá existe, emoldurada, à parede.
Uma jovem funcionária se aproximou e buscando ser gentil lhe perguntou se ele estava gostando da visita ao Museu.
Colombo respondeu que sim. Mas, brincando, indagou quem era aquele personagem ali retratado.
A recepcionista, sem fazer a ligação entre o personagem que estava em sua frente e a pintura, respondeu que se tratava de uma autoridade importante da nossa história catarinense.
E a funcionária completou dizendo que soube que era um político famoso, um governador do estado, mas que já tinha falecido.
Pintura do ex-governador Colombo Machado Salles existente no Museu Anita Garibaldi. Foto: Valmir Guedes Júnior. 

Colombo Salles desceu as escadas sorrindo e sempre chegava às gargalhadas quando contava esse episódio para familiares e amigos.
Da visita ao Museu até seu falecimento passaram-se muitos anos. 

Obras para Laguna
Governador dos catarinenses de 1971 a 1975 (seu vice foi o empresário Atílio Fontana), Colombo Salles trouxe a Fundação Bradesco para nossa cidade, que leva o nome de sua primeira professora, Adélia Cabral Varejão.
Enviou a verba para construção em lajotas da chamada Avenida Perimetral, cujo projeto previa um sistema viário que circundaria toda a cidade, incluindo Magalhães e Mar Grosso, o que hoje seria denominado anel viário.
Infelizmente, por problemas políticos e má gestão, essa avenida que depois levou seu nome, foi interrompida por muitos anos nas imediações do Colégio Stella Maris e do então Conjunto Educacional Almirante Lamego (Ceal).
Estação Rodoviária da Laguna inaugurada em 1973, mas restaurada, ampliada e ativada somente em 23 de fevereiro de 1979 na gestão Mário Remor. Na foto, o então governador Colombo Salles descerra a placa de inauguração. De costas, o ex-prefeito Saul Ulysséa Baião. Acervo: Valmir Guedes Júnior

A Rodoviária Municipal, que depois virou Terminal Rodoviário, foi obra de sua gestão (1973), assim como o Ginásio (Coberto) de Esportes, inaugurado em 1975 e que levou o nome de seu sogro Bertholdo Werner.
Era prefeito da Laguna à ocasião, o advogado Saul Ulysséa Baião.
Ginásio de Esportes Bertholdo Werner, inaugurado em 1975. Foto: Valmir Guedes Júnior
O sogro de Colombo, Bertholdo Werner era sócio da tradicional Joalheria e Relojoaria Werner. Era casado com Maria Guedes Werner e tiveram duas filhas: Ema, casada com o médico Pedro Miranda; e Dayse, casada com o engenheiro Colombo Salles em 30 de setembro de 1950 na Igreja Matriz Santo Antônio dos Anjos.
Foi também em sua gestão os fundamentos do novo prédio do Fórum, inaugurado alguns anos depois.
Sem falar no prédio do Centro Integrado Profissionalizante (CIP), que também por falta de gestão, de interesse de nossos governantes, não chegou a funcionar em sua plenitude. 
No imóvel depois se instalou o Colégio Comercial Lagunense (CCL) e hoje funciona a Udesc.

Ex-governador Colombo Machado Salles e ex-prefeito da Laguna Saul Ulysséa Baião em encontro social no Clube Congresso Lagunense em 14 de janeiro de 2005. Foto: Valmir Guedes Júnior
Quando foi Administrador do Porto da Laguna, de 1950 a 1960, Colombo Salles muito contribuiu com nossa sociedade, utilizando funcionários e instalações do porto para beneficiar entidades assistenciais e clubes de nossa cidade.
Foi também o engenheiro que fez os cálculos estruturais, estáticos e supervisionou a construção da Estátua de Nossa Senhora da Glória, sua base e instalação. Imagem inaugurada em 31 de maio de 1953, com grande pompa, idealizada e construída pelo casal de escultores alemães Alfredo e Elisa Faccio Itaege.
Em 1955 projetou e construiu uma Linha de Transmissão Elétrica desde a central da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) no hoje município de Capivari de Baixo, para suprir o Porto da Laguna e também a própria cidade, quando não havia navios atracados. 
Havia um usina própria no porto mas era muito deficitária, por isso apelidada pela população de pisca-pisca e vagalume.
A vida de Colombo já estava intimamente ligada ao mar, não só por possuir o prenome do maior navegador espanhol, mas também por ter como progenitor Calistrato Müller Salles, engenheiro-chefe do porto lagunense por vários anos, e que foi homenageado com seu nome à principal via de acesso à nossa cidade, no bairro Portinho.

Estudos com Modelo Reduzido da Barra e Porto lhe trouxe como prêmio uma bolsa de estudos na França
Em 1958 Colombo produziu o “Relatório Colombo Salles”, com dados coletados durante um ano sobre a nossa barra, marés e profundidade do canal.
Na entrevista para meu livro sobre o Porto ele relembrou: 

“Uma aventura. A bordo de uma simples e pequena baleeira chamada “Macaréu”, com alguns corajosos funcionários, percorremos todo o mar da Laguna, colhendo informações com referências à ondas, marés, correntes marítimas, correntes de fluxo e refluxo no canal e no interior das lagoas, além da análise granulométrica de material de fundo”.

Em função desse trabalho, o engenheiro Colombo, com ajuda de Ivo Simião da Luz, Mestre em Marcenaria, construiu um “Modelo Reduzido do Complexo Flúvio-Marítimo da Laguna”.

No Modelo, que ficou exposto no pátio do porto durante muitos anos, Colombo criou artificialmente a nossa Barra com seus molhes em pedras, marés, ondas e até assoreamentos. Provou com isso o erro na construção dos Molhes da Barra da Laguna, com suas envergaduras em forma de tenaz.
Obtive uma foto inédita do Modelo Reduzido que expus em meu livro.
Maquete (Modelo reduzido) dos Molhes da Barra da Laguna construído pelo engenheiro Colombo Machado Salles.
O trabalho, pelo seu caráter pioneiro, fez enorme sucesso, lhe valendo uma bolsa de estudos no Laboratório Central de Hidráulica da França, para onde viajou com a família.
Colombo Salles defendeu em 1969 que o porto pesqueiro da Laguna, que então se pretendia construir, fosse anexo paralelamente ao porto carvoeiro.
Não lhe deram ouvidos e, sendo assim, o porto carvoeiro foi desmantelado, com a retirada em 1973 de guindastes, trilhos da estrada de ferro, etc.
Colombo Machado Salles era casado com a também lagunense Dayse Werner Salles, namorada da adolescência e deixa os filhos Maria José, Bertholdo e Marcelo.
Governo do estado e prefeitura da Laguna decretaram luto oficial.
Corpo foi velado na Assembleia Legislativa de Santa Catarina e sepultado no Cemitério Jardim da Paz, na capital do estado.


5 comentários:

  1. Sempre que nós encontrávamos era uma boa conversa,que esteja na luz junto daqueles que amavas.Ainda menina conheci dona Bertha,uma senhora simples e querida.Infelizmente hoje não existe políticos como sr Colombo Salles,educado,simples e honesto.

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  2. Linda reportagem e homenagem. Quantas fotos.

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  3. Um homem, um cidadão, um político íntegro, competente, probo; um lagunense simples, popular e querido pelos seus liderados no Porto de Laguna; culto, inteligente, um exemplo e uma inspiração para homens de bem. Sua trajetória pautou-se por uma Geometria de Linhas Claras. Aos familiares, o nosso abraço de conforto pela perda.

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  4. Geraldo de Jesus17/11/2023, 13:20

    Foi um ótimo governador e uma boa pessoa. Pena que é um país sem memória.
    Hoje os medíocres tomaram conta.
    E se acham.
    O povo também é culpado por votar errado.
    Mais um resgate histórico e enriquecido pelas fotos.

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  5. Valmir... parabéns por mais um excelente trabalho, onde foi devidamente apresentada a vida do ilustre lagunense Colombo Machado Salles, que nunca mediu esforços para colaborar com a "sua" Laguna... em vários momentos e das mais diversas formas, desde sua participação ativa como engenheiro e administrador do nosso porto, assim como, enquanto profissional atuando em diversos cargos públicos. Sua competência, capacidade de atuar em vários segmentos como gestor da "coisa pública"... aliada a sua ilibada honestidade, o levaram a ser escolhido como Governador de Santa Catarina no período de de 1971 a 1975, tendo feito um bom governo e mais uma vez procurou auxiliar de diversas formas a Laguna. Tive a felicidade de algumas vezes e junto de outras pessoas, conversar com ele... que sempre se mostrou simpático com todos.
    Grande abraço do Adolfo Bez Filho - Joinville / SC.

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