terça-feira, 10 de julho de 2018

Clito Araújo: o soldado lagunense que não voltou

“Histórias são para sempre, mas só se você contá-las”.

De 6 de setembro de 1944 a 2 de maio de 1945, durante os 239 dias de combate dos soldados da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália, aconteceram 468 baixas, entre mortos e desaparecidos brasileiros.
Entre eles, o soldado lagunense Clito Antônio de Araújo, que integrava a 4ª Cia do 6º RI (Regimento de Infantaria Ypiranga), morto aos 24 anos.
O soldado Clito Araújo. Álbum de família. Acervo: Marega.
Clito Araújo nasceu na localidade de Siqueiro, na Laguna (hoje pertencente à Pescaria Brava), em 1920. Era filho de Antônio Ciríaco de Araújo e Fernandina Medeiros de Araújo.
Fez parte do 1º Escalão da FEB a embarcar para o teatro das operações na Itália, em 2 de julho de 1944, a bordo do navio general Mann.
Distintivo da FEB. A cobra vai fumar.
Seguiu viagem junto a outros companheiros lagunenses, como Ezio Pagani, Manoel Ismael da Silva, Waldemar Apolônio Antunes, Sadi Silva Ferminio, Jovino Salvador da Silva, Milton Fonseca, David Lemos, Manoel Moura de Jesus, Bernadino Vieira de Andrade, Antônio Juvêncio Corrêa e Valdiniro Abrahão Pereira (Xavante), entre outros.
Esse primeiro escalão brasileiro com 5.075 soldados desembarcaria em Nápoles em 16 de julho de 1944. O total efetivo chegaria a 25.334 participantes, com 956 soldados vindos do solo catarinense.

No front da guerra
Nos primeiros dias de novembro de 1944, os soldados da FEB são transferidos de Castelnuovo di Garfagnana para o front de guerra, no Vale do Rio Reno.
Nos Apeninos vão enfrentar o rigoroso inverno, com muita chuva, neve e depois lama, além de ataques contínuos dos alemães. Lutam contra a denominada Linha Gótica.
Mapa da Vitória na IIª Guerra, distribuído pelo Exército Brasileiro.
A fase compreendida entre 5 de novembro e 12 de dezembro de 1944 será conhecida como “Defensiva-Agressiva”, desenvolvida inteiramente no Vale do Reno. A intenção dos comandantes era a conquista de Bolonha antes do natal daquele ano. Tal não vai acontecer.  Somente no ano seguinte. A FEB atuará nesta região por mais de três meses, integrando o IV Corpo do Exército.
Neste período acontecerão as batalhas e as tomadas de Montese, Soprassasso e Monte Castelo. Lutarão contra a 148ª Divisão Panzer da Infantaria, até a completa rendição alemã.

A morte em batalha por estilhaços de granada
Conta-se que a morte em combate do pracinha lagunense, pertencente à Infantaria Brasileira, deu-se da seguinte forma:
Era para ser um “Golpe de mão”, assim chamado um assalto à trincheira inimiga para aprisionamento de soldados. Clito Araújo teria prosseguido em marcha na batalha em Marano, Itália, quando se viu sozinho, entre muita fumaça e tiros, no meio de um pelotão inimigo. Tinha avançado demasiado no terreno íngreme e escorregadio. Logo seria descoberto e sua morte era iminente.
Que fez? Teria detonado uma granada, pondo fim a sua vida e a dos inimigos ao seu redor. Com o silêncio no front, vários pracinhas brasileiros logo acorreram ao local, conquistando mais terreno na batalha travada.
Mas logo obtiveram a explicação acima para o ocorrido, reconhecendo então a coragem do lagunense Clito Antônio Araújo, com apenas 24 anos. Era o entardecer chuvoso do dia 13 de novembro de 1944. Quem contava essa história a este autor era outro pracinha lagunense, o veterano tenente Sadi Ferminio.

Moraes fala sobre o período de Defensiva-Agressiva
O general comandante da FEB J.B. Mascarenhas de Moraes, em suas memórias lembrando aquelas batalhas diz:

“Prematuramente aspirada para a linha de combate, a divisão brasileira distendeu-se numa frente da ordem de 15 quilômetros. Seu setor era tão devassado pelas alturas ocupadas pelo inimigo que o comando americano houve por bem instalar nessa região uma cortina de fumaça permanente, a fim de permitir os rápidos e indispensáveis movimentos na estrada nº 64, que liga Porreta a Bolonha e está implantada à margem do Reno. Inteiramente dominada pela contínua linha de alturas que vai de Belvedere a Castelnuovo, ficava esta estrada ao alcance eficiente de morteiros e até tiros diretos das armas automáticas instaladas nesses maciços montanhosos. Durante o período de Defensiva-Agressiva, o IV Corpo empreendeu algumas operações ofensivas. Dadas as deficiência e limitações já expostas, não poderia alcançar senão amargos reveses”.

Vasco Gondin, outro veterano da guerra, em seu livro de Memórias “Liberdade escrita com sangue”, sobre o primeiro revés dos brasileiros afirma:
“Assistíamos o avanço dos alemães, pedíamos barragens de artilharia, munição, alimentação, etc., e elas não vinham. Defendemos como podíamos com nossas armas, granadas de mão e alguns tiros de morteiro. Mas nada detinha o alemão, parecendo-nos um rolo compressor”. (...) “A luta chega ao corpo a corpo”.

Sepultamento
Os combatentes da FEB que pereceram na IIª Guerra Mundial foram primeiramente sepultados no cemitério militar de Pistóia (Itália). O jazigo de Clito Araújo ficava na quadra C, fileira nº 10, sepultura nº 119.
Monumento Nacional aos Mortos na 2ª Guerra, no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro. Foto: FEB.
Posteriormente, em 1960, os restos mortais de todos os pracinhas sepultados na Itália foram transferidos para o Monumento Nacional aos Mortos na 2ª Guerra, inaugurado em 5 de agosto daquele ano, no Parque do Flamengo, na Gávea, no Rio de Janeiro. Nele encontra-se o túmulo do soldado desconhecido, com a pira eterna, e o mausoléu com 468 jazigos.

Mausoléu de Clito Araújo no Monumento do Aterro do Flamengo, no RJ. Foto: Carlos Augusto Baião da Rosa.
Condecorações e homenagens
Clito Araújo foi agraciado com as Medalhas de Campanha, Sangue do Brasil e Cruz de Combate de 2ª Classe.
Medalha Sangue do Brasil. Reprodução wikipédia..
Medalha de Campanha. Reprodução wikipédia.
Medalha Cruz de Combate 2ª Classe. Reprodução wikipédia.
Clito Araújo é nome de via pública no centro histórico da cidade Juliana, (Travessa entre as ruas José Joahnny e Tenente Bessa, a rua das árvores como alguns a chamam).
Laguna também prestou homenagem a Clito Araújo com nome de uma via no centro histórico da cidade, além de um monumento.
No Rio de Janeiro, em Paciência, nosso herói também foi homenageado com nome de rua. Assim como no bairro Jardim Figueira, em Guarulhos, São Paulo.
Busto de Clito Araújo, na Praça do Ex-combatentes, na Laguna.
Em 1995, o 3º sgt Nilson Vasco Gondin, que exercia a presidência da Associação Nacional dos Veteranos da FEB-Seção Regional de Florianópolis (já falecido), e o lagunense José Paulo Fortunato Goulart, presidente da Liga de Defesa Nacional - Seção de Santa Catarina (também já falecido) constituíram uma comissão para angariar recursos para construir um monumento para homenagear o soldado expedicionário lagunense. 
Contaram com o apoio do prefeito da Laguna Nazil Bento Jr., do presidente da Assembleia Legislativa do Estado, deputado Pedro Bittencourt Neto, e do Tenente-Coronel Lincoln Ungaretti Branco, comandante do 63º Batalhão de Infantaria (BI) Fernando Machado.
Artista plástico Plínio Verani esculpe o busto do veterano morto em batalha na Itália, Clito Araújo. Foto: Nilson Vasco Gondin no livro "Liberdade escrita com sangue".
O monumento, com o busto de Clito Antônio de Araújo, obra do artista plástico catarinense Plínio Verani Júnior foi inaugurado em 17 de janeiro de 1996, na Praça do Expedicionário, situada entre a rua Calheiros da Graça e avenida Colombo Machado Salles, na Laguna.

Por mais terras que eu percorra...
Clito Antônio Araújo. Ele deu sua vida para salvar outros, em nome da democracia e da liberdade, lutando contra o nazifascismo.
Eis um verdadeiro herói lagunense, tão esquecido pelas novas gerações.

Na saída do Monumento Nacional aos Mortos da 2ª Guerra, no Aterro do Flamengo, no Rio, encontram-se os seguintes dizeres:

E enquanto subir os degraus rumo ao sol, certo de que na penumbra da cripta há mais luz do que no adro do Monumento, lembre-se de que aqueles homens, tão jovens e tão cheios de ardor pela Pátria, pela qual iriam morrer, cantavam esperançosos o estribilho da Canção do Expedicionário:

"Por mais terras que eu percorra, não permita Deus que eu morra, sem que volte para lá, sem que leve por divisa, esse "V" que simboliza a vitória que virá".
***************

P S: O monumento em homenagem a Clito Araújo precisa de manutenção, assim como a própria Praça dos Expedicionários. Limpeza, pintura e um “banho” de cêra de carnaúba no busto de bronze urgente!
Alô, alô, prefeito. Alô, alô presidente da Fundação Lagunense de Cultura.

9 comentários:

  1. Parabéns Valmir. Reportagem pra gente guardar e fonte de pesquisa pra muitos alunos. Que os professores de nossa cidade leiam para seus alunos. Muitos passan por ali e nem sabem disso.
    Edison de Andrade

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  2. Parabéns pela reportagem e divulgação de mais um heroi catarinense. Que a família Araújo sinta-se abraçada e orgulhosa!

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  3. Meus Deus! Nem conhecia essa história desse herói. Só se fala de Anita Garibaldi. Parabéns.
    Geraldo de Jesus

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  4. Esta ai uma história que deve ser estudada nos livros das escolas

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  5. Lagunenses com vigor e honra....

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  6. MICHELLE CELESTE MACIEL29/06/2020, 23:45

    Meu Deus! Que emocionante ler tudo isso! Clito foi meu tio avô! Meu pai leva seu nome, Antônio Araújo Maciel, filho da irmã do Clito, minha falecida avó, Carmem Fernandina Araujo Maciel!!! MUITO obrigada por compartilhar! Qd meus avós se foram eu era pequena. Nunca descobri a história do tio... Sempre pesquisei, mas até agora a tua é a mais completa! Saudações da família!!!

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    1. Grato Michelle pelas palavras. Saudações também a ti e família.

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  7. MICHELLE CELESTE MACIEL29/06/2020, 23:47

    Gratidão! Saudações da família Araújo Maciel! Sd, herói Clito, meu tio avô!

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  8. Zuleida Rosa25/07/2024, 12:07

    A história triste de um conterrâneo. Não tem como não se emocionar.

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