O dia em que a merda parou (e borbulhou)

Alguns dias antes do natal, lagunenses, turistas e veranistas começaram a se deparar com enormes poças de esgoto pelas ruas do Mar Grosso. 

O líquido escuro e viscoso borbulhava dos bueiros e o fedor era insuportável. Os coliformes fecais nadavam de braçada. Nado livre, "dis costas" e borboleta.

Logo veio a explicação da Casan: o emissário submarino estava entupido. O sistema leva o esgoto, por tubulação e sem qualquer tipo de tratamento, da chamada Bacia A (entre a Praça Francisco Pinho, no Iró e a Praça Moreira Netto (Praça do Vila), a 1.500 metros da costa marítima.

Já o esgoto da Bacia B, da Praça do Vila em direção ao Magalhães está ligado à rede da Estação de Tratamento (ETE) situada na Vila Vitória (Alagamar).

No dia 31, prefeitura e Casan emitiram notas oficiais e individuais sobre o problema, enquanto fotos e filmagens do esgoto a céu aberto viralizavam nas redes sociais, para vergonha das nossas autoridades. E nossa também,  perante familiares e amigos de fora.

A Casan dizia que uma equipe de trinta profissionais, inclusive mergulhadores, atuava para resolver o problema, que já havia há quase um mês.

Uma vala de esgoto por dentro da área do porto

Já a prefeitura informava em sua nota que “a partir da Rua Renê Rolim, será reconstruído e desobstruído, nos próximos dias, o ramal principal existente, que coleta parte do pluvial comprometido, em direção à área do Porto e destino final, o que reverterá a dependência ao emissário submarino”.

Perceberam? Parte das águas pluviais (chuva) misturada com o esgoto de ligações clandestinas vai em direção à área do porto, tomando uma vala a céu aberto, num TERMINAL PESQUEIR0, ONDE SE MANUSEIA PESCADO, e desembocando em seu “destino final”. 

Sabe qual é o destino final? As águas da Lagoa Santo Antônio dos Anjos, a bacia de evolução do porto, no canal dos Molhes da Barra da Laguna, no santuário dos botos pescadores. 

Vejam as fotos aéreas feitas por Elvis Palma:

Observem o "destino final", a cor escura d'água da Lagoa Santo Antônio dos Anjos, com os dejetos dos esgotos clandestinos e o rastro deixado pela balsa ao passar por ali.

            

Fatos e fotos
O repórter fotográfico Elvis Palma fez várias fotos sobre os problemas do esgoto, com ampla repercussão nas redes sociais. 

Já o réveillon na Laguna foi passado desse jeito, com muitos olhando os céus para assistir aos fogos, mas desviando-se de poças para não pisar na merda.

Praça Moreira Netto (do Vila), na virada do ano. Fotos: Facebook

Enquanto a ponta entupida do emissário submarino não era encontrada, uma frota com seis caminhões hidrojatos foi contratada, em caráter emergencial, sabe-se lá a que valor, para através de sucção e transporte, levarem o esgoto para a Estação de Tratamento.

E dá-lhe transtornos com compressores ligados, além de pesados e enormes caminhões circulando 24 horas por dia, em ruas estreitas, pingando aqui e ali o nauseabundo líquido.

Esgoto sendo sugado antes da Estação Elevatória. Foto: Elvis Palma.

Uma rede provisória com tubulação de 110 mm também foi montada, obstruindo calçadas e ruas, desde a rua Carazinho – entorno da Praça do Vila – em toda extensão da rua Renê Rollin, até encontrar a rede coletora da bacia B (nos Molhes). Um caos!

Para agravar, numa tragédia já anunciada e repetida ano após ano, a questão do esgotamento sanitário no referido bairro ficou agravada em virtude de ligações clandestinas na rede pluvial.

Emissário desobstruído

Na quarta-feira, 2 de janeiro, a Casan informava que havia conseguido desobstruir parcialmente as tubulações do emissário, mas que os caminhões continuariam sendo utilizados.

Força tarefa da prefeitura

No dia seguinte (quinta-feira 3), a prefeitura informava que equipes da Fundação Lagunense do Meio Ambiente (Flama), Vigilância Sanitária, Casan, prefeitura, Guarda Municipal e Polícia Militar Ambiental atuariam visando principalmente as ligações clandestinas de esgoto.

Os proprietários de imóveis irregulares serão multados e autuados e as equipes ainda atuarão no problema de escoamento da rede pluvial, boa parte obstruída, dizia a nota da prefeitura.

Na verdade, são serviços que deveriam ser permanentes, o ano inteiro.

Ligações clandestinas e sem habite-se

Já no primeiro dia de fiscalização por parte da prefeitura, duas ligações irregulares foram lacradas. Uma em um edifício (o nome não foi divulgado), e outra em uma casa. Nos dois casos, a rede de esgoto estava ligada diretamente à rede de coleta da água da chuva.

O prédio, situado na avenida Maurílio Kfouri (ex-Rio Grande do Sul) ainda foi notificado por não ter o habite-se.

E aí a gente se pergunta: Como assim? Sem habite-se e com moradores? Cadê a fiscalização por parte dos órgãos responsáveis?

Tudo junto e misturado

Na tarde e noite de ontem, quinta-feira (3), um aguaceiro de alguns minutos espalhou ainda mais o esgoto do Mar Grosso pelas areias da praia e no mar. Ficou tudo junto e misturado.

Será que a água não ficou contaminada? E a areia da praia, onde escorreu o esgoto não estará tomada de bactérias, tipo escherichia coli?
Todo esse esgoto não provocará infecções urinárias, intestinais e viroses?

A responsabilidade por essas respostas e pela saúde pública da população cabe às autoridades.