domingo, 29 de março de 2015

Roteiro para bons negócios imobiliários (Parte I)

Pense no seguinte leitor: você tem um terreno pra vender. Ele está totalmente legalizado, com escritura e tal. Vamos dar um preço de mercado pra ele? Suponhamos que esteja avaliado em R$ 100 mil.
Aí certo dia aparece na sua casa um interessado.  
Ele quer comprar o seu terreno E ele está com pressa.
Faz uma oferta pelo lote. Digamos que oferece R$ 40 mil em dinheiro, em 4 parcelas mensais e consecutivas. Os outros R$ 60 mil que faltam ele oferece outro terreno, como permuta, num loteamento à beira da praia, que parece valer muito mais dos que os R$ 60 mil.

Só tem um pequeno problema. O lote não está legalizado, não tem escritura individualizada e como é na beira-mar, há que se conversar com o Patrimônio da União. Mais uma coisa: tem uns probleminhas com licença ambiental, etc. mas nada que não se possa resolver mais adiante. O pretenso comprador está bem intencionado, o problema é que ele parece desconhecer as implicâncias legais da oferta.

O que você faz?  Aceita imediatamente o negócio e assina ali mesmo os documentos? Nem para pra pensar um pouco?

Um bom negociante faz o seguinte: oferece mais um cafezinho ao pretenso comprador, fala sobre o tempo chuvoso e diz que vai meditar sobre a proposta. Precisa conversar com a patroa e coisa e tal, consultar um amigo advogado (e hoje em dia todo mundo parece ter um amigo advogado) ou um corretor também amigo, para ver as perspectivas de mercado.
- Vou pensar, finalmente você exclama, deixe seu telefone que entro em contato. Até logo.

Na manhã seguinte, ou nos dias seguintes, você vai fazer umas consultas. Dirige-se até o cartório e indaga à situação daquele loteamento. Consulta igualmente o setor da prefeitura quanto a expedição de alvarás, construções, gabaritos, etc.

Você lembra também que o terreno oferecido como parte está situado num loteamento em cima de dunas, ou restinga ou vegetação nativa, ciliar, sei lá. Faz também uma consulta à Fundação Meio Ambiente de sua cidade, à Fatma e a Polícia Ambiental. É bom se precaver. Sabe como é, o terreno pode ser residência oficial da coruja-buraqueira e é bem provável que será difícil despejá-la...

Uma chegadinha ao Ministério Público é imprescindível.
Aproveita que está na fase de consulta e também pergunta a uma ONG de baleia se construções são permitidas naquela área, se o barulho de obras em certa época do ano não pode incomodar os cetáceos em seu período de acasalamento, amamentação. Vai que...

De posse de todas essas informações, essas consultas verbais, você pensa, põe tudo na ponta do lápis, noves-fora-zero, conversa com a sua cara metade e só aí, toma a decisão em aceitar ou não a proposta.
Isso tudo você deve fazer se o terreno for particular, se ele for seu.

Agora imagine se o lote for público, envolvendo os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e entidade beneficente, sem fins lucrativos?
Multiplique, então, os cuidados por dez e as consultas verbais que você fez, passam a ser todas por escrito, em duas vias, com autenticação e firma reconhecida!

Excesso de conservadorismo, leitor? Nada disso. Chama-se precaução, cuidado, canja de galinha. Tudo para evitar futuras dores de cabeça e arrependimentos. 
Mas ainda há nos dias de hoje, por incrível que pareça, quem não tome esses cuidados.

(Continua).

Um comentário:

  1. Bom dia Valmir!
    Estarei à espera da continuidade dessa tão preciosa aula de "Direito social"! ou "Desafios Sociais Contemporâneos". (atualmente)
    Parabéns !
    Maria de Fatima Martins

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